2 de maio de 2020

emergência, 13




deu-se um toque.
da confusão no acesso ao labirinto ficou um sinal,
ténue marca de água
que ninguém compara às chagas de cristo,
traço sem ferro nem brasa
cicatriz sem ferida, tatuagem sem tinta
rasto invisível no ar que arredonda a pele.
dos passos desencontrados na boca do labirinto
ficou uma fronteira portátil entre ti e o mundo,
entre as casas de minha mãe e de minha neta
atravessam-se agora passaportes, vistos, certificados;
entre hoje e ontem, entre hoje e o que falta fazer
há um traço intransponível na poeira do chão,
os meridianos do planeta encostaram-se a um lado
para reajustar os espaços entre as aldeias e os bairros,
os mapas estão corroídos e a geografia
é um negócio fervente nos mercados de futuros.
cavadas pelo sopro temido dos estigmatizados
há dicionários inteiros de palavras irrecuperáveis
no palimpsesto indecifrável de um quotidiano
onde a luz crua da incerteza profunda
traz no bojo o passado triunfante como linha do horizonte.
acordar é uma necessidade emergente.


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2 de Maio de 2020, último dia do estado de emergência

(Imagem "a ver", de Porfírio Silva)

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